por Leonardo Ramos[i] e Helena Ribas Françozo[ii]
Nos dias 15 e 16 de novembro de 2015 ocorreu em Antália, Turquia,a 10ª cúpula de líderes do G20.Desde que assumiu a presidência do G20, a Turquia priorizou o “crescimento inclusivo e robusto através da ação coletiva”, o que ficou expresso nos três pilares da presidência turca (“três Is”): (i) implementação dos compromissos passados; (ii) investimentos para fortalecer a recuperação econômica e o potencial de crescimento dos países; e (iii) promoção da inclusão (Turkey G20, 2015, p. 3)[iii]. A partir de tais prioridades, bem como dos desdobramentos da conjuntura internacional, eram aguardadas ações por parte do G20 com relação à economia mundial; aos refugiados e à Síria[iv]; e às mudanças climáticas tendo em vista COP-21. A despeito de tais expectativas, poucos foram os avanços da cúpula.
Apesar dos compromissos feitos na cúpula de Brisbane (2014) – aumentar o crescimento econômico mundial em pelo menos 2% até 2018 –, em 2015 a situação da economia mundial ainda preocupa: de acordo com o FMI, as recentes transformações econômicas da China, a queda no preço das commodities e o iminente aumento da taxa de juros dos EUA levarão o crescimento global a uma taxa de 3,1% este ano – a menor taxa de crescimento desde 2009 (em 2014 havia sido de 3,4%) –, expressão de um modesto crescimento dos países avançados (2%) e de um declínio no crescimento dos países emergentes (de 4,6% em 2014 para 4% em 2015)[v]. Contudo, o G20 simplesmente manteve a meta acordada no Plano de Ação de Brisbane. De acordo com o G20, segundo análises feitas pelo FMI, OCDE e Banco Mundial, mais de um terço dessa medida já teria sido atingida desde a cúpula de 2014 (G20, 2015a, p. 1)[vi]; não obstante, não há clareza acerca do acompanhamento dessas metas, o que demonstra problemas para sua credibilidade.
No tocante às mudanças climáticas, havia a expectativa que o G20 produzisse um comunicado que pudesse dar algum sinal positivo para a COP-21. Os países reforçaram o compromisso com a meta de manter o aquecimento global abaixo de 2°C acordada em Lima (G20, 2015a, p. 6); não obstante, não houve menção a algum tipo de mecanismo que obrigasse os países a revisar periodicamente suas metas antes dos prazos finais (no caso, 2020), o que poderia acelerar o ritmo das mudanças – neste caso, Índia e Arábia Saudita se colocaram contra tal tipo de mecanismo (Barker & Clark, 2015)[vii].
O que se percebeu, na verdade, foi a expansão da agenda para abarcar o âmbito da segurança, tendo em vista os últimos ataques terroristas que antecederam a cúpula e a atual crise dos refugiados, enfatizando a necessidade de cooperação na luta contra grupos extremistas de ação transnacional. Foi chamada atenção para os três últimos atentados: explosões em Antália, 10 de outubro; a derrubada do avião com passageiros russos no Egito, dia 31 de outubro; explosões e tiroteios em Paris dia 13 de novembro. Neste sentido, os líderes condenaram as ações terroristas e enfatizaram a necessidade de lutar contra os canais de financiamento dos grupos terroristas através da implementação do FAFT(G20, 2015b)[viii]. De fato, a questão do terrorismo ganhou destaque na cúpula por seu caráter recente e urgente, porém as resoluções oriundas desta possuem mais um caráter de repúdio aos atentados do que a declaração para implementação de grandes instrumentos para essa luta.
Às margens da cúpula, EUA e Rússia se encontraram e, embora isso não aponte necessariamente um arrefecimento significativo das relações entre tais países[ix], expressa um consentimento mínimo de que deve haver uma melhor coordenação dos ataques aéreos na Síria e no Iraque (PAÍSES…,2015)[x]. Neste sentido, a cúpula de Antália foi palco de uma significativa mudança: se na cúpula anterior, em Brisbane (2014)[xi], houve pressão para a exclusão de Putin da cúpula em função do envolvimento russo na crise da Crimeia, desta vez ficou claro que qualquer possibilidade de resolução do conflito na Síria passa necessariamente pela Rússia (Barker & Parker, 2015).
Atrelado a isso, os líderes do G20 demonstraram-se preocupados com a escalada da crise de refugiados, afirmando a necessidade de uma resposta coordenada e abrangente para se abordar essa crise de maneira efetiva, medindo também suas consequências no longo prazo. Estes se comprometeram com o fortalecimento dos esforços de assistência para os refugiados e apelaram a todos Estados para ajudar a encontrar uma resposta para as causas dos deslocamentos, assim como fornecer condições enquanto esta não é estabelecida (G20, 2015a).
Tendo em vista o pilar sobre promoção de inclusão, foi discutida a relação entre crescimento e emprego, assim como seu impacto sobre desigualdade. A partir disso, os líderes enfatizam a necessidade de integração dos jovens no mercado de trabalho, através da promoção do empreendedorismo. Para tanto, os membros do G20 acordam com a meta de redução do número de jovens que possuem mais risco de permanecer fora do mercado de trabalho em 15% até 2025 em seus respectivos países, delegando a OCDE e a OIT um papel no processo de monitoramento desse objetivo. (G20, 2015a) No sentido de mitigar as desigualdades, o grupo também estabeleceu o Woman 20 (W20) como um grupo oficial do G20. O W20 defenderá a igualdade de gênero e poderá contribuir para se atingir a meta adotada em Brisbane (2014) em reduzir a diferença de participação feminina no mercado de trabalho em 25% até 2025 (W20, s/d)[xii].
Menção também foi feita às questões de investimento em infraestrutura, comércio internacional e reforma da arquitetura financeira internacional – com ênfase para a implementação da reforma das cotas do FMI. Contudo, partindo daquelas que eram as expectativas iniciais, a cúpula ficou bem aquém do esperado, a despeito de avanços interessantes nas discussões sobre o terrorismo assim como no processo de outreach do G20[xiii]– destaque para o W20. Neste sentido, as atenções agora são voltadas para a presidência chinesa do G20 e como esta lidará com as questões relacionadas aos objetivos iniciais do G20 em 2016.
[i] Professor do Departamento de Relações Internacionais (PUC Minas) e coordenador do Grupo de Pesquisa das Potências Médias (GPPM).
[ii] Pesquisadora do Grupo de Pesquisa das Potências Médias (GPPM)
[iii]http://g20.org.tr/wp-content/uploads/2014/12/2015-TURKEY-G-20-PRESIDENCY-FINAL.pdf.
Além disso, seguindo o costume segundo o qual o país anfitrião convida um país não membro do G20 para participar da cúpula, a Turquia convidou o Azerbaijão para a cúpula de 2015. Alguns elementos de destaque para tal convite: Turquia e Azebaijão compartilham traços étnicos comuns; a Turquia é a rota preferencial para a exportação do gás e do petróleo do Azerbaijão – o que se expressa no milionário projeto de construção do gasoduto transanatolio (TANAP); o Azerbaijão tem acusado a Armênia de assentar armênios sírios refugiados na região de Nagorno-Karabakh, que se encontra em disputa entre Azerbaijão e Armênia; e a Turquia tem um papel central na integração do Azerbaijão nas organizações internacionais (Daloglu, 2013; Daily News, 2013; Veliyev, 2015).
Daily News. Syria Armenians move to Nagorno-Karabakh: Azerbaijan. 02/10/2013. http://www.hurriyetdailynews.com/syria-armenians-move-to-nagorno-karabakh-azerbaijan.aspx?pageID=238&nID=55588&NewsCatID=352
DALOGLU, Tim. Turkey-Azerbaijan relations still strong.04/11/2013. http://www.al-monitor.com/pulse/originals/2013/11/azerbaijan-turkey-relations-russia.html
VELIYEV, Javid. Azerbaijan-Turkey relationship passed the 2015 exam. Daily News.http://www.hurriyetdailynews.com/azerbaijan-turkey-relationship-passed-the-2015-exam.aspx?pageID=449&nID=77364&NewsCatID=396
[iv] Há mais de 2 milhões de refugiados sírios na Turquia, e neste sentido era esperado por alguns que a cúpula contribuísse para um esforço internacional coordenado para lidar tanto com os refugiados quanto com o conflito em si (Rachman, 2015, p. 2).
RACHMAN, Gideon. Summitt likely to highlight G20’sinner political tensions. Financial Times, 15/11/2015. http://www.ft.com/intl/cms/s/0/497329d6-84b9-11e5-8095-ed1a37d1e096.html
[v]International Monetary Fund.World economic Outlook.2015. http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2015/02/pdf/text.pdf.
Uma importante implicação deste declínio dos países emergentes diz respeito à relação entre BRICS e G20: ao contrário do que ocorreu em cúpulas anteriores, em Antália o grupo não teve um papel de destaque, apresentando uma declaração que, em termos objetivos, reproduz em larga medida elementos presentes em declarações passadas do grupo (http://www.itamaraty.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12403:reuniao-informal-dos-lideres-do-brics-a-margem-da-cupula-do-g20-antalia-15-de-novembro-de-2015&catid=42:notas&lang=pt-BR&Itemid=280).
[vi] G20. Leaders’ Communiqué.Turquia, 2015a.Disponível em: <http://www.g20.utoronto.ca/2015/151116-communique.html>. Acesso em: 22 nov. 2015
[vii]BARKER, Alex & CLARK, Pilita. India slows progress on ambitious climate change accord. Financial Times. 16/11/2015. http://www.ft.com/intl/cms/s/0/de7a31b6-8c55-11e5-8be4-3506bf20cc2b.html
[viii] G20. Statement on the Fight Against Terrorism.Turquia, 2015b. Disponível em: <http://www.g20.utoronto.ca/2015/151116-terrorism.html>. Acesso em: 22 nov. 2015
[ix] “Há ‘desacordos’ com Sr. Putin acerca do future de Bashar al-Assad, o líder sírio que é apoiado por Moscou, disse o Sr. Obama. David Cameron, primeiro ministro britânico, descreveu a distância entre o ocidente e a Rússia acerca de Assad como ‘enorme’” (Barker & Parker, 2015, p. 2)
BARKER, Alex & PARKER, George. Putin transformed from outcast to problem solver at G20. Financial Times. 16/11/2015. http://www.ft.com/intl/cms/s/0/be96ed0c-8c88-11e5-8be4-3506bf20cc2b.html
[x] PAÍSES do G20 declaram combate conjunto ao terrorismo. Carta Capital. 16/11/2015. Disponível em <http://www.cartacapital.com.br/internacional/paises-do-g20-declaram-combate-conjunto-ao-terrorismo-2431.html>.
[xi] G20 Brisbane Summit, 2014: some keynotes.
https://grupoemergentes.wordpress.com/2014/11/21/g20-brisbane-summit-2014-some-keynotes/
[xii] W20. About W20. s/d. Disponível em: <http://w20turkey.org/about-w20/>. Acessoem: 22 nov. 2015
[xiii]https://grupoemergentes.wordpress.com/2015/11/27/o-g20-em-antalya-2015/
e
https://grupoemergentes.wordpress.com/2014/12/01/o-b20-na-cupula-de-brisbane-2014/